segunda-feira, 30 de outubro de 2017

SAGRADO INDÍGENA: Não confunda respeito com adoração…

Por: Jairo Lima

Por que, em vez de respeitar e seguir os conselhos dos mestres passamos a dever-lhes culto, adoração e obediência? - Estive matutando sobre isso durante a semana, enquanto participava das discussões sobre a realização da I Conferência Indígena da Ayahuasca, a Yubaka Hayrá.

Uma coisa que aprendi nessa convivência de muitos anos com os povos indígenas foi entender  a profundidade da palavra ‘respeito’. Palavra esta extensível a muitas coisas, entre estas a busca espiritual.

Deve ser porque os tempos de minhas andanças mais constantes pelas aldeias no Aquiry foram em épocas em que não existia esse ‘booom’ xamânico de butique, de maneira que, para ter acesso aos ensinamentos profundos dos mistérios encantados do huni (ayahuasca) era preciso encarar muitos dias de viagens, suportando os infernais piuns e as agruras do inconstante e mal-humorado clima amazônico.

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

UM ESCLARECIMENTO PARA ALGUNS RACISTAS: Somos muito mais do que apenas os ossos e o passado que vocês reverenciam


Por: Raial Orotu Puri
"Quando os acadêmicos vêm falar com a gente é só pra fazer pesquisa. Não nos veem como povo, como pessoas, somos apenas ossos.” -(Vherá Poty , 19/10/2016, Congresso da Sociedade de Arqueologia Brasileira - Regional Sul.)

Devido a algumas questões que vivenciei na semana que passou, fui levada a recordar de uma conversa havida meses atrás com uma arqueóloga estrangeira em visita ao Acre. No referido diálogo, ela me perguntou se eu já havia visitado um Geoglifo, e me falou sobre o quão importante é tal experiência, para, palavras delas “poder reconhecer a perícia e sabedoria das populações ameríndias que habitaram a Amazônia milhares de anos atrás”...

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

MEU TEMPO DE CRIANÇA NOS SERINGAIS DO RIO MURU - parte 1


Por: Txai Antônio Macedo

Começa aqui, a partir deste texto, uma série de memórias que marcaram este personagem que vos escreve. Acompanhe as travessuras desse amigo de todos vocês através deste espaço de crônicas indigenistas...

O que penso da palavra saudade? Bem, meu tempo de criança às vezes me dá saudades... ás vezes não. Na minha concepção, saudade é palavra triste do ponto de vista da perda ou distância de alguma coisa infalível, ou uma maneira de lembrar com alegria, pessoas ou momentos vividos. Se assemelha a faca que corta nos dois gumes.

Abro essa conversa aqui falando de mim mesmo, e dos meus tempos vividos de infância nos seringais do Aquiry. Graças a Deus, não perdi um grande amor, nesta estrada longa da vida, e mesmo assim, vou chorando a minha dor, igual uma borboleta, vagando por sobre a flor.

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

SOBRE LUTO, PENSAMENTOS, ESPINHOS E FLORES…

Por: Jairo Lima

Olhando para o cursor piscando na página em branco virtual a tela do meu computador fico pensando em várias coisas, enquanto a brisa fria alisa-me as sensações e me fazem querer voltar para a cama, deixando ‘tudo pra lá’.

Os fortes ventos e a fria chuva do inverno nos trouxe uma semana de tristeza e indignação no Aquiry indígena, trazendo dois fatos que, apesar de singulares, na essência, trazem um ponto comum de reflexão e nos remetem a pensamentos profundos sobre essa natureza social e cultural que separa os grupos humanos, destacando as virtudes de uns e ignomínia de outros.

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

CRIANDO O ÓDIO E CULTIVANDO A INDIFERENÇA: algumas reflexões a mais sobre a falta de empatia para com as questões de vida e morte dos povos originários

Por: Raial Orotu Puri


O ódio não vem apenas do medo e da incompreensão do desconhecido e do diferente. Ao longo da história, o ódio também foi uma construção que serve a fins políticos. Construção tão bem feita que passamos a achar que aquilo plantado dentro de nós por terceiros sem que percebêssemos, na verdade, é nosso. (Leonardo Sakamoto)

Recentemente li o artigo do Jornalista Leonardo Sakamoto, do qual extraí o excerto acima, e que trata de como ondas de fundamentalismo, intolerância e moralismo podem ser fomentadas mediante a utilização dos veículos de mídia. Embora abordasse a questão dos recentes casos de ataques à manifestações artísticas, o artigo analisava o uso dos mesmos por políticos interessados em aumentar sua popularidade afim de conquistar votos – especificamente citando o caso de Lorde Farquaad*, o atual prefeito engomadinho de São Paulo.

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

UMA VIAGEM PELOS JARDINS DOS POVOS INDÍGENAS

Homenagem à jornalista Laura Rachid
Por: Antônio Macêdo

Hoje me dirijo aos meus leitores com o mesmo amor e carinho que sempre chego às muitas aldeias e seringais do Acre, do Sudoeste do Amazonas e Noroeste de Rondônia.
Assim como também cheguei aos diversos lugares do Brasil, como Cuiabá-MT, Brasília-DF, São Paulo-SP, Rio de Janeiro-RJ e até fora do país, como Estados Unidos, França, Inglaterra, México, Noruega e outros cantos do mundo que já andei a trabalho do desenvolvimento dos povos da floresta.

Hoje, venho falar de mais uma dessas lindas viagens feitas na floresta do meu estado do Acre, com o intuito claro de homenagear uma pessoa querida.
Laura Rachid, uma amiga jornalista maravilhosa de 24 anos que realizou sua primeira experiência nas aldeias indígenas do Acre. Visitou os povos Huni Kuin do Alto Tarauacá, Rio Jordão e Rio Breu, passou pelo povo Apolimas-Arara para chegar à aldeia Ashaninka do Rio Amônia, dormiu em aldeia Ashaninka do Rio Breu e conheceu os Kuntanawa do Rio Tejo. Tudo isso em minha companhia por 52 dias, na recente viagem que tive o privilégio de realizar.

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

EXERCITANDO A ARTE DE VIVER: Ensinamento Ashaninka...

Ou, como uso o conhecimento do Povo Ashaninka como uma de minhas filosofias de vida…
Por: Jairo Lima

“(...) Nossa cabeça é como o mundo e o mundo é como nossa cabeça. A testa é o pensar. O pensar é a calma (1), a ação, a adrenalina, o susto (2) e a reflexão (3). Os Ashaninka sempre agiram para manter esses três em equilíbrio” - Wewyto Ashaninka*

Parece que o céu se diluiu totalmente em lágrimas que lavaram e abençoaram o Juruá. Miríades de cupins voadores, que o povo daqui costuma dizer que é uma ‘formiga’, invadiram o céu à tardinha e se aglomeraram enlouquecidamente em torno de qualquer facho de luz, como se estivessem hipnotizados. Assim foi o fim de semana que oficialmente abriu nosso inverno, e que, se nos balizarmos por esta pequena amostra, certamente teremos meses muito ‘molhados’.

Não sei definir como foi a semana que passou, ao contrário do que faço comumente, pois, ao sentir os nervos à flor da pele e a mente sobrecarregada de preocupações, me dei conta de que precisava ‘retirar-me’ desse plano, camuflando-me de maneira despercebida, como se o ‘mundo’ passasse por mim inadvertido de minha presença e eu, também, despercebido, não daria conta da passagem deste.

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

TEMPOS CONFUSOS E INSENSÍVEIS...

A crescente repressão que a arte vem sofrendo no Brasil é realmente uma questão complicada... mas você já ouviu falar do Genocídio Indígena?

Por: Raial Orotu Puri

Realmente vivemos tempos estranhos nessa terra que batizaram de Brasil... As notícias, movimentos, mobilizações e fogueiras cotidianas da internet de fato têm deixado explícito que, parece que quanto mais avançamos no tempo em termos históricos, mais as pessoas parecem ser invadidas por um certo quê de ethos medieval. Um dos campos que mais tem despertado este espírito é o das artes, com um conjunto de situações estranhas em que repentinamente exposições, quadros e performances são julgados por uma multidão de críticos de arte saídos do nada.

Bem, sobre esse assunto, eu gostaria de dizer que não tenho necessariamente uma opinião muito completa a manifestar. Antes de qualquer coisa, porque eu não sou crítica de arte, nem a consumo em profusão o suficiente para me arrogar a isto. Claro, não estou dizendo que só quem tenha alguma formação ou qualquer coisa do tipo possa omitir opiniões sobre o que é ou não arte. É só que eu penso que nesses casos deveria valer aquela regra de ouro de que o fato de eu não gostar de um determinado tipo de arte não me concede legitimidade para simplesmente decretar que aquilo de que não gosto não é arte.

Afinal de contas, existe uma diferença bastante considerável entre eu não gostar de algo, e acreditar que o meu ‘não gosto’ me dá algum direito quando a dar um veredito sumário acerca da impossibilidade de existência daquilo de que eu não gosto, não é mesmo?! Do mesmo modo que existe uma diferença enorme entre considerar uma arte ruim e associá-la à apologia a um crime dos mais graves, tal como é a associação que tem sido feita à pedofilia. (Cite-se sobre isso o caso de um quadro que era uma denúncia e que foi tratado como apologético...)

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

O COMEÇO DE MINHA HISTÓRIA: Do berço de ouro ao paraíso perdido

Por: Txai Antônio Macêdo
Primeiras memórias: meu pai...
Procuro reconstituir a memória e a história de um grande infante, porém determinado, e  por sua vez traído pelo destino inóspito de um “paraíso perdido”.

Meu pai senhor Raimudo Batista de Macêdo, por ironia do destino aos seus nove anos de idade saiu de Belém de onde vivia em glória junto com meu avô Miguel Arcanjo de Macêdo, minha avó Luíza Guedes de Macêdo, meu tio José Batista de Macêdo (J.Macêdo), suas irmãs Noêmia Cunha de Macêdo, Edite Batista de Macêdo, Josefa Batista de Macêdo dentre outros possíveis irmãos.

Nascido em 27 de setembro de 1909, por volta de 1918, com aproximadamente 09 (nove) anos de idade foi autorizado por meus avos acompanhar sua madrinha numa viagem aventureira ao Aquiri, atualmente Acre. Localidade que mais tarde passou a ser chamado território do Acre.

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

SAGRADO DE BOTECO e outras reflexões sobre as esquisitices da semana...


Por: Jairo Lima

Nesta semana confusa, onde uma forte chuva indicando a chegada de nosso ‘inverno’ amazônico trouxe destruição e prejuízos ao Seringal Empresa*, aqui pelas bandas do Juruá as águas ainda não caem com tanta frequência, mas o vento fresco e a sensação de ‘abafado’ é o sinal que vem muita água em breve.

Não posso dizer, nem reclamar que o mês octo** chegou de mansinho, em passos tediosos. Ao contrário, entre os afazeres da labuta diária e ‘papos de índio’ bem interessantes, não pude deixar de registrar em meus alfarrábios mentais algumas situações que, se não carecem de maior atenção através de um papo mais profundo, também não poderia deixar passar ao largo de minha pena. Destas situações cito uma bem interessante.

Vamos lá...

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

NADA IMPEDIRÁ: Algumas reflexões febris sobre conformismo e determinação.


Por: Raial Orotu Puri

Depois de alguns dias de silêncio após um texto suicida, de um sem número de crises por conta de tentar - com parcelas iguais de sucesso e falta dele - escrever a minha tese de doutorado para qualificação antes do final do ano, e antes que meu orientador me mande um bilhete ameaçador acompanhado de antraz, eis que resolvi dar uma pequena pausa para escrever uma reflexão para a semana (neste caso, também antes que eu receba merecidamente uma carta bomba do meu amigo Jairo).

Resolvi começar do zero outra vez, apesar de ter um texto já bem avançado e em fase de fechamento... Acho que como na semana passada não consegui chegar à conclusão, penso que não cabe insistir naquele assunto por hora. Talvez algum dia volte a ele.

Penso ser importante ressaltar um detalhe nada pequeno a respeito do texto presente: dado que meu notebook velho de guerra já está há dias em vias de cruzar o cabo da Boa Esperança, e, infelizmente, nem duas visitas à manutenção foram suficientes para afastá-lo do vale da sombra da morte, este texto está sendo escrito naquela que é praticamente a única ferramenta que está mais ou menos funcionando em toda a estrutura sem que seja necessário reiniciar a cada 10 minutos: o bloco de notas! (Pois é, agora calculem os efeitos disso quando você já está nervosa por conta da necessidade de escrever um trabalho e imaginem o meu nível de simpatia para com a situação...)

segunda-feira, 2 de outubro de 2017

SAGRADO INDÍGENA: quando a busca pela cura vira um negócio de desavisados...

Por: Jairo Lima

A última semana do mês de setembro já ia dobrando a esquina do calendário, e eu ainda não tinha ouvido as cigarras que sempre fazem seu triste concerto nesta época do ano. Por onde andam as cigarras? Pude notar que não fui o único a sentir sua ausência, pois observei manifestações de outras pessoas sobre isso, nas redes sociais.

Um estranho cansaço tomou conta de mim nesta semana e junto com ele a melancolia acenava-me matreira, mas dela fugi, dedicando minha atenção e pensamentos a outras paragens mais positivas, longe de sua vista e influência.

Entre as labutas e pelejas diárias do meu indigenismo de cada dia me deparo com as mais diversas (e em alguns casos bizarras) situações, que me testam os limites constantemente.
Entre estas atividades costumo atender a visitantes que vêm de várias partes do mundo em busca de vivências nas comunidades, sendo estas, quase em sua totalidade, voltadas ao xamanismo. São atendimentos diretos e, em alguns casos, intervenções indiretas em situações que necessitam de uma atenção mais institucional para resolver alguma situação (muitas vezes desagradáveis), durante estas visitas.